Todos sabemos que a crise que São Paulo atravessa no campo da segurança pública não é fato isolado. Mais de meio milhão de pessoas foram assassinadas nos últimos 10 anos no Brasil. Estamos lidando com problema histórico, endêmico e crônico. Quanta desgraça. Vidas interrompidas de modo estúpido. Famílias enlutadas, marcadas por lembranças inapagáveis, sempre presentes nos seus raros momentos de felicidade.
Por que essas mortes acontecem? Um ponto de partida para o tratamento da questão é saber que a solução para o problema é sistêmica. Nenhuma resposta isolada o resolverá. Estamos lidando com questões sociais graves que se retroalimentam, cuja consequencia mais espantosa é esse massacre de vidas humanas típico de guerra civil.
Cremos que cinco medidas, que não esgotam o que precisa ser feito, mas reconhecidamente essenciais para a diminuição da letalidade no Brasil, precisam ser implementadas urgentemente, sob pena de mais pessoas morrerem, a crise se aprofundar e a nossa democracia cair em descrédito. O que de mais importante tem que ser implementado?
1. A reforma da polícia. Nossos bons policiais não conseguem trabalhar. O maior obstáculo que enfrentam é a imensa corrupção com a qual estão envolvidos muitos dos seus companheiros, alguns em postos de comando, numa escala significativamente grande a ponto de inviabilizar qualquer tipo de trabalho mais efetivo.
Muitos policiais sentem-se usados. Pouco valorizados. Pessimamente remunerados, embora exerçam ocupação extenuante. Mal preparados e comandados, da noite para o dia, de posse de arma e distintivo, passam a gozar de uma autoridade que nunca deve ser exercida sem treinamento e supervisão.
Nos Estados temos duas polícias atuando: a militar e a civil. Aquela, fazendo o policiamento ostensivo, trabalhando na rua; esta, exercendo a função de investigar os crimes praticados. Trabalhos que se complementam. O que poucos sabem, é que essas polícias mal se falam, se boicotam, não cooperam uma com a outra. Por que duas polícias? Qual a razão de não termos apenas uma fazendo ambas as coisas? Por que nossa polícia está entre as que mais matam no mundo? Quem policia a polícia?
2. A reforma do sistema prisional. Não há paz do lado de fora das prisões sem dignidade do lado de dentro delas. A sociedade paga duplamente pelas atrocidades cometidas no sistema prisional. Mortes nas ruas. Mortes nas celas. Atentados injustificados contra gente inocente a mando de alguns dos detidos. Tortura injustificada contra gente que -se encontra sob custódia do Estado- para também ser reintegrada socialmente. Tudo isso com dinheiro público. É bom para a sociedade torturar preso?
3. Metas de redução de homicídio. Por que milhares de brasileiros são cobrados no seu ambiente de trabalho a perseguir metas de produtividade e os que atuam na área da segurança pública, não? Todos os Estados da federação deveriam ter alvos claros de redução da letalidade. A sociedade faria o acompanhamento, cobrando resultados, e os gestores prestando contas das suas ações.
4. Transparência e rapidez na apresentação das estatísticas de mortes violentas. O Estado tem a obrigação de manter a sociedade informada sobre tema de interesse público desta magnitude. Temos o direito de saber quantos foram mortos. Somente assim poderemos mensurar o desempenho da polícia e a cada passo avaliar se o planejado se mostrou exeqüível.
5. Implementação de políticas públicas nas comunidades pobres. Pobreza não é sinônimo de banditismo. A esmagadora maioria dos pobres trabalha duro. A desigualdade social, numa cultura de consumo desmesurada, é que é a praga. Ela serve de parteira do crime. Pega o latente e o torna patente. Põe para fora o que não se manifestaria necessariamente se não fosse provocado. Pense no sentimento que pode dominar pessoas que vivem em ambientes de exclusão, privação e vulnerabilidade. Reflita sobre a falta de acesso a educação de qualidade, moradia digna, saneamento básico, área de lazer, transporte público, salário justo. Quem mata e morre são rapazes negros e pardos, entre 18 e 25 anos, moradores de comunidades pobres.
Estamos coletando assinaturas. Tencionamos dizer à Presidente da República e ao Ministro da Justiça que -o acima exposto é demanda de um povo que exige mundança-, farto de ver a fortuna da sexta economia do mundo não estar sendo usada para o essencial, perplexo pela letargia do poder público em implementar medidas tão óbvias e ansioso por ver democracia associada a justiça no Brasil.
Assine, povo brasileiro: Manifesto pela Redução de Homicídio no Brasil
Antônio Carlos Costa
Presidente do Rio de Paz
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